Estudo de Interferência por Corrente Alternada em Dutos Enterrados

1. INTRODUÇÃO

As correntes alternadas dispersas no solo através de sistemas elétricos c.a., principalmente sistemas de transmissão de energia elétrica acima de 69 kV, podem produzir efeitos danosos a estruturas enterradas, as quais devido sua massa metálica e extensão consideráveis conduzem estas interferências que, encontrando um ponto que favorece o retorno para sua origem, geram potenciais que podem afetar a integridade e segurança da estrutura e de pessoas.

A análise destas interferências e de seus efeitos sobre dutos enterrados requer, além de medições de campo, dados da origem da interferência e do duto afetado, como a resistência do revestimento, o diâmetro, o traçado e a localização de juntas ou flanges isolantes. Também devem ser considerados dados como a tensão da linha interferente, a corrente operacional, a localização, o arranjo das torres e a posição dos fios, o traçado (incluindo a posição de transformadores), frequência e características elétricas.

Com todas as informações acima citadas, é realizada uma análise computacional detalhada dos efeitos das correntes de interferência c.a. em regime permanente e transitório (curto-circuito), através de software específico que tem como finalidade calcular os efeitos de cada circuito energizado sobre os dutos, obtendo os valores de tensões induzidas na tubulação que possam causar danos às pessoas e ao revestimento do duto (comparando com os limites das normas vigentes). O software permite também simular os valores a serem obtidos após a instalação de ações de mitigação dos efeitos das interferências no caso de os limites normativos serem excedidos com base nos resultados obtidos no estudo.

 

2. INTERFERÊNCIA AC

A energia elétrica proveniente de fontes c.a. de alta tensão, como linhas de transmissão, podem interferir em dutos enterrados através de três mecanismos: acoplamento condutivo, acoplamento capacitivo ou eletrostático e acoplamento indutivo ou eletromagnético. A intensidade destas interferências, permanentes ou em prazos curtos, depende de diversos fatores, entre eles:

  • existência de cruzamentos das linhas interferentes com o duto;
  • comprimento do trecho paralelo ou quase paralelo;
  • distância entre o duto e a fonte de interferência;
  • resistividade do eletrólito ao longo do traçado do duto;
  • nível de tensão da linha c.a.;
  • nível de corrente da linha c.a.;
  • qualidade do revestimento do duto.

Regiões de cruzamentos de linhas de transmissão c.a. com dutos e trechos em que estas linhas estejam paralelas e próximas às tubulações numa distância até 200 m devem ser incluídos nos estudos dos efeitos causados por interferência eletromagnética.

ACOPLAMENTO CONDUTIVO
É produzido quando ocorre um curto-circuito fase-terra ou uma falha na linha, a qual pode ser causada por: descargas atmosféricas que ionizam o ar nas proximidades de um isolador, ventos fortes, falha nos isoladores ou contatos acidentais das linhas com outras estruturas próximas.

Em condições de falha, a corrente dispersa no solo tende a retornar à sua origem através do caminho de menor resistência elétrica, o qual geralmente é ofertado por tubulações metálicas enterradas próximas às linhas de transmissão. A quantidade de corrente conduzida dependerá de todas as impedâncias relativas ao circuito elétrico que traduz o sistema estudado, da distância entre a estrutura em falha e o duto, da corrente de falta, da impedância à terra da estrutura em falha e da impedância à terra do duto.

A corrente é conduzida pelo duto através do revestimento. Quanto melhor a qualidade deste revestimento e maior seja a sua capacidade dielétrica (potencial de ruptura), menor será a corrente transferida pelo duto.

ACOPLAMENTO CAPACITIVO
Neste efeito, a energia é transferida através da capacitância elétrica existente entre o duto e a linha de transmissão, atuando como um capacitor. A capacitância é diretamente proporcional à superfície dos condutores e inversamente proporcional à separação entre os condutores.

No caso de dutos em construção, onde os tubos são desfilados ao longo da faixa em paletes de madeira, e existem linhas de transmissão paralelas, é formado um elemento capacitivo: dos condutores elétricos separados por um material dielétrico. Forma-se, ainda, um segundo capacitor em o duto e o solo. Esta configuração representa um circuito elétrico formado por dois capacitores em série com uma fonte c.a., formando um divisor de tensão capacitivo. A tensão entre a linha de transmissão e o solo se divide entre dois capacitores com proporção inversa às capacitâncias dos mesmos.

ACOPLAMENTO INDUTIVO
A corrente de uma linha de transmissão é induzida sobre o duto, gerando um campo eletromagnético ao redor da estrutura enterrada. A intensidade do campo magnético é diretamente proporcional à intensidade da corrente e inversamente proporcional à distância entre o duto e linha de transmissão. Através da “regra da mão direita”, é possível determinar o sentido da corrente em relação ao fluxo magnético.

O acoplamento indutivo é produzido quando o duto está paralelo à linha de transmissão. Enquanto os potenciais gerados eletrostaticamente são proporcionais à tensão da linha elétrica e os potenciais e correntes induzidos eletromagneticamente são proporcionais à corrente da linha elétrica. À medida que a distância do paralelismo entre a linha de transmissão e o duto diminui, o acoplamento indutivo gerado pode produzir potenciais e correntes que afetam tanto a integridade do duto (riscos de corrosão por c.a.) como a segurança de pessoas (riscos de choque elétrico).

 

3. METODOLOGIA DE ESTUDO

Os cálculos de perfil de tensão ao longo da tubulação, devido ao acoplamento condutivo, são realizados através do software CEDEGS Right-of-Way, desenvolvido pela companhia SES, composto por diversos módulos que permitem calcular desde a estratificação do solo, utilizando os dados de resistividade medidos, até os efeitos de interferência eletromagnética oriundos das linhas de transmissão, em situações permanentes e de curto-circuito.

A partir dos dados obtidos com o software CEDEGS, é efetuada uma avaliação dos riscos ao duto e à segurança das pessoas, oriundos da interferência eletromagnética, com base nos critérios definidos em normas vigentes.

É realizado o levantamento de resistividade elétrica do eletrólito nas regiões das estruturas mais próximas de cada ponto de cruzamento e/ou paralelismo, em 03 (três) eixos distintos da torre, utilizando o arranjo de Wenner (método dos quatro pinos), obedecendo-se o disposto na Norma ABNT NBR 7117-1: Parâmetros do solo para projetos de aterramentos elétricos Parte 1: Medição da resistividade e modelagem geoelétrica e ASTM G-57 – Standart Method for Field Measurement of Soil Resistivity Using the Wenner Four Electrode Method, para as profundidades a partir de 1,00 m até a profundidade que seja suficiente para a estratificação do solo no local medido.

Os eixos de medição são definidos de forma a abranger a maior região de cobertura possível, para evitar que sejam introduzidas interferências nos valores medidos pela proximidade com condutores metálicos presentes ou por acoplamento indutivo com as linhas de transmissão.

Os resultados obtidos no levantamento de campo são inseridos no módulo RESAP do software Right-of-Way, para obtenção da estratificação do solo nas regiões de cruzamento e/ou paralelismo das linhas de transmissão com o duto.

A análise das interferências eletromagnéticas causadas no duto, contemplam os efeitos de acoplamento indutivo e condutivo, considerando a proximidade e geometria das estruturas analisadas, bem como a magnitude da tensão nominal das linhas de transmissão.

A análise de curto-circuito (falta monofásica) é efetuada considerando as torres mais próximas do cruzamento e/ou paralelismo e a fase mais próxima ao encaminhamento do duto. Os resultados irão corresponder aos cenários de pior impacto no duto interferido.

Os cálculos realizados para regime transitório consideram, simultaneamente, os fenômenos de acoplamento indutivo e condutivo entre a linha de transmissão e o duto. Os efeitos decorrentes de acoplamento capacitivo são desconsiderados em dutos enterrados. Os cálculos apresentados consideram os arranjos típicos dos cabos contrapeso de cada torre.

Ainda como resultados, são apresentados diagramas de correntes de curto-circuito, nos cabos para-raios e nos cabos da fase mais próxima ao duto, geometricamente, em cada cruzamento das linhas de transmissão com a tubulação.

 

4. MITIGAÇÃO

Devem ser tomadas medidas de mitigação de interferências com base nas normas vigentes que estabelecem os limites máximos admissíveis que são válidos para garantia da segurança de pessoas e integridade de estruturas, nas condições de regime permanente e curto-circuito.

Em regime permanente, a tensão máxima estrutura-solo em pontos acessíveis a qualquer pessoa não pode ser superior a 15 Vef, definida como tensão de segurança, conforme Norma ABNT NBR 16563-1:2016.

No regime transitório (curto-circuito), devem ser elaboradas medidas de mitigação que suportem os valores máximos admissíveis das tensões tubo/solo, toque e passo.

A tensão máxima de passo e toque deve ser limitada de acordo com os requisitos de segurança locais ou nacionais e deve ser obedecida em todos os locais onde uma pessoa possa tocar o duto ou um de seus componentes. A Norma ABNT NBR 16563-1:2016 recomenda que as tensões máximas geradas não podem ser superiores aos valores máximos admissíveis, calculados de acordo com as seguintes equações:

Etm = (1000+1,5p) x 0,116/√t             Epm = (1000+6p) x 0,116/√t

Onde:

  • Etm é a tensão de toque máxima admissível, expressa em volts (V);
  • Epm é a tensão de passo máxima admissível, expressa em volts (V);
  • ρ é a resistividade do solo homogêneo, expressa em ohms metro (Ωm);
  • t é o tempo de duração do curto-circuito, expresso por segundos (s). Para um intervalo de tempo superior a 3 s, deve ser utilizada a tensão máxima de 60 V.

A Norma ABNT NBR 16563-1:2016 estabelece que a tensão máxima duto-solo em qualquer ponto do duto ou qualquer equipamento conectado a ele não pode ser superior a 5 kV. Em juntas de isolamento tipo monobloco o valor praticado é o mesmo, porém para juntas flangeadas (convencionais), o valor máximo a ser considerado é de 2 kV.

A tabela a seguir é a mesma apresentada no item 7.1 da Norma ABNT NBR 16563-1:2016, que mostra um resumo das medidas mitigadoras, com suas características.

 

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  • NACE SP 0177-2007. Mitigation of Alternating Current and Lightning Effects on Metallic Structures. NACE, 2007.
  • ASTM G-57 – Standart Method for Field Measurement of Soil Resistivity Using the Wenner Four Electrode Method. ASTM, 2012.
  • NBR 16563-1. Mitigação de efeitos de interferências elétricas em sistemas dutoviários Parte 1: Sistemas de corrente alternada. ABNT, 2016.
  • NBR ISO 15589-1. Indústrias de petróleo, petroquímica e gás natural — Proteção catódica de sistemas de transporte por dutos Parte 1: Dutos terrestres. ABNT, 2016.
  • NBR 7117-1. Parâmetros do solo para projetos de aterramentos elétricos Parte 1: Medição da resistividade e modelagem geoelétrica. ABNT, 2020.
  • DUTRA, A.; NUNES, L. Proteção Catódica – Técnica de Combate à Corrosão. 5ª edição. Rio de Janeiro: Interciência, 2012.
Veja também